quarta-feira, 19 de agosto de 2015

A cidade de Rafael


Todos iam perder suas casas e ir embora. A cidade estava defasada, desanimada, era um declínio imortal que pairava por ali. Tudo bagunçado, as ruas destruídas e ninguém mais se importava com liderança. Nem sequer havia um prefeito ou um capitão que fosse. Apesar de tudo, a terra era fértil e produtiva, a questão é que ninguém sabia produzir.

As pessoas eram preguiçosas, teimosas e conformadas com seu próprio lixo. Haviam cerca de 150 pessoas ali, mas nem as crianças eram mais tão animadas. Os parques e as praças quase não existiam. Em todos os cantos ouviam-se as pessoas resmungando, mas nunca modificando. Todos queriam algo diferente mas ninguém lutava por isso. E muitos tentavam sair, mas não tinham para onde ir.

A cidade era esquecida, abandonada. Por muito tempo foi assim, até que a economia parou, o dinheiro deixou de funcionar e as pessoas voltaram a fazer trocas. O plantio era a única solução, mas não estava mais funcionando. Sem falar que a população masculina cresceu tanto que haviam 20 homens para cada mulher, e por conta disso haviam disputas. O índice de adultério era alto e a miséria fez com que muitos tomassem atitudes desrespeitosas e agressivas.


Por muito pouco as pessoas se destroem. Elas formam dentro de si conceitos concretos de ética e moral, mas esses conceitos de nada valem quando a situação fica altamente crítica. Foi isso que ocorreu com aquela pequena população. Todos esqueceram o amor e o carinho. Todos deixaram de lado seus bons costumes quando perceberam que passariam fome caso ajudassem ao próximo. Todos tinham medo de dar ao vizinho o que necessitavam para sobreviver. Não demorou muito até que uns começassem a roubar os outros. Muitas confusões ocorreram e a cada dia que se passava, as soluções e as reflexões iam sendo deixadas para trás.

Aquela cidade deixou de ser uma cidade. As mulheres foram estupradas até a morte porque os homens, extremamente machistas, fizeram questão de assediá-las até esse ponto. Terríveis criaturas dominadas pelo pecado e pela sede sexual. Depois mataram uns aos outros culpando-se individualmente por problemas que todos eles construíram em conjunto. Meio século depois, a cidade foi encontrada às ruínas por pesquisadores. Moradores mortos nas calçadas ou dentro de casa. Alguns enterrados no fundo da cidade e outros ainda, cobertos por palhas de bananeira.

As conclusões foram diversas e não entraram em consenso. Mas todos, no fundo, sabiam que ali houve um colapso social. Um grupo de pessoas, esquecidos pelo mundo e sem a presença de qualquer líder, automaticamente destruíram uns aos outros. Não são todos que vivem sozinhos sem um guia, por mais que este guia seja outra pessoa. Para não depender deste guia, é preciso ter autoconhecimento e autoliderança, e ninguém ali tinha desenvolvido isso. Todos eram ignorantes, mas não porque deviam e sim porque não buscavam o conhecimento. E assim, por falta de comunhão social, aquela cidade deixou de existir.

Noctur Spectrus

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